domingo, 21 de agosto de 2016

Aula 18/2016 - Comoção social e atitudes

Omran Daqneesh tem 5 anos. O corpo coberto de pó e a cara está ensanguentada. Está sentado na ambulância, sem dizer uma palavra ou verter uma lágrima. A imagem tornou-se viral e ilustra o horror de quem vive na Síria.
O vídeo foi registado pela Aleppo Media Center minutos após um ataque aéreo num bairro da cidade.


Material da Aula
TEXTO 1 – Fato motivador - Imagem de menino de 5 anos após bombardeio em Aleppo gera comoção
Um menino de cinco anos, coberto de sangue e poeira, olha assustado para a câmera. Sentado em um banco dentro de uma ambulância, sua imagem gerou comoção internacional.
Omran Daqneesh foi vítima de um ataque aéreo em Aleppo, no norte da Síria. O bombardeio ocorreu em um bairro controlado pelos rebeldes opositores do ditador sírio, Bashar al Assad, em meio à guerra civil que consome o país há cinco anos.
O garoto chegou ao hospital na noite de quarta-feira (17) com ferimentos na cabeça, mas já recebeu alta. O ataque ocorreu minutos após um caça decolar da base russa em Latakia, no litoral da Síria. A Rússia é importante aliada de Assad e realiza frequentes bombardeios nas áreas rebeldes.
O vídeo com a imagem de Omran foi divulgado pelo grupo Aleppo Media Centre, ligado à oposição síria. O menino foi identificado nesta quinta-feira (18) pelo médico que o atendeu em um hospital de Aleppo, Osama Abu al-Ezz.
Omran foi resgatado com os três irmãos —de 11, seis e um ano de idade— e os pais dos escombros do apartamento da família, parcialmente destruído após o ataque aéreo, de acordo com Mahmoud Raslan, repórter fotográfico autor da imagem que trabalha como correspondente para a rede Al Jazeera. Segundo Raslan, nenhum dos familiares de Omran teve ferimentos graves. O ataque teria ocorrido durante o período de reza no fim da tarde, por volta das 19h20 desta quarta.
A comoção gerada pela imagem de Omran ecoa a foto de Aylan Kurdi, menino de três anos cujo corpo foi encontrado em uma praia na Turquia, em setembro do ano passado, depois do naufrágio da embarcação em que estava sua família. Eles tentavam chegar à ilha grega de Kos.

TEXTO 2 – Tragédia humanitária na Síria, com 270 mil mortos em cinco anos
A guerra da Síria matou 270 mil pessoas, deslocou cerca de metade da população e deixou grande parte do país em ruínas desde o seu início, há cinco anos.
Eis alguns factos e números sobre o conflito:
O Observatório Sírio dos Direitos Humanos (OSDH), que dispõe de uma ampla rede de fontes na Síria, contabilizou 271138 mortos desde o início do conflito em março de 2011. Desse total, 79106 são civis, entre os quais se encontram 13500 crianças e 8760 mulheres, de acordo com um balanço divulgado a 23 de fevereiro deste ano.
Não estão incluídos os milhares de desaparecidos cujo destino se desconhece, opositores nas prisões do regime e membros das forças lealistas capturados pelos rebeldes e pelos grupos jiadistas, como o Estado Islâmico (EI).
Num relatório divulgado em fevereiro, investigadores da ONU afirmaram que milhares de pessoas detidas pelas diferentes partes morreram, acusando o regime de Damasco de "extermínio" de prisioneiros.
Segundo uma organização humanitária síria, 177 hospitais foram destruídos e perto de 700 trabalhadores da saúde foram mortos.
No passado dia 7, a organização não-governamental (ONG) francesa Handicap International deu conta de um milhão de feridos.
Num país que tinha cerca de 23 milhões de habitantes antes do conflito, 13,5 milhões de pessoas foram afetadas ou deslocadas pela guerra, de acordo com números da ONU relativos a 12 de janeiro.
"Pelo menos 250 mil crianças vivem em estado de cerco em zonas (...) que se tornaram verdadeiras prisões a céu aberto", denunciou este mês a ONG Save de Children.
Mais de 450 mil pessoas estão atualmente sitiadas na Síria, segundo o Alto Comissário para os Direitos Humanos da ONU.
A guerra também obrigou 4,7 milhões de pessoas a fugirem do país, "a maior população de refugiados de um único conflito numa geração", afirmou em julho de 2015 o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR).
A Turquia é atualmente o principal território de asilo daqueles refugiados, acolhendo entre 2 e 2,5 milhões de sírios. O Líbano tem cerca de 1,2 milhões, segundo fontes oficiais. Mais de dois terços vivem em "pobreza extrema", segundo a ONU. Na Jordânia estão registados junto do ACNUR cerca de 630 mil, mas as autoridades estimam o seu número em mais de um milhão. No Iraque estão refugiados 225 mil sírios e no Egito 137 mil.
Vivendo em estruturas provisórias, os refugiados enfrentam a pobreza, problemas de saúde e tensões crescentes com as comunidades locais. Uma grande maioria continua nos países da região, mas são cada vez mais os que chegam à Europa após uma viagem perigosa e incerta.
Segundo os especialistas, o conflito fez recuar três décadas a economia do país, privado de quase todas as suas receitas e com a maioria das infraestruturas em ruínas.
Os sistemas de educação e de saúde estão destruídos.

TEXTO 3 – Imagem chocante de menino 'não vai mudar nada', diz pediatra sírio
A foto do pequeno Omran sentado no interior de uma ambulância coberto de poeira e sangue comoveu o mundo, mas, na Síria em guerra, milhares de outras crianças vivem traumatizadas pelos ataques aéreos, mutiladas ou prestes a morrer nas cidades sitiadas.
O menino, cuja imagem foi compartilhada por milhões de internautas nas redes sociais e que estampou as manchetes do mundo inteiro, é, segundo Washington, "a verdadeira face da guerra" na Síria, que em cinco anos e meio deixou mais de 290 mil mortos.
"O caso de Omran não é excepcional. A cada dia, tratamos dezenas de crianças que sofreram ferimentos graves", relata o Dr. Abou al-Baraa, cirurgião pediátrico na região rebelde de Aleppo, entrevistado nesta sexta-feira por telefone.
Em um vídeo filmado pela rede de militantes do Centro de Meios de Comunicação de Aleppo (AMC), o pequeno Omran aparece limpando seu rosto ensanguentado com a mão. Depois olha para sua mão e, sem acreditar, limpa-a em seu assento.
Segundo o médico, "há milhares de histórias de crianças amputadas, feridas na barriga ou na cabeça" desde o início da guerra, em 2011. O conflito atingiu um ano depois a segunda maior cidade do país, dividida entre bairros controlados pelo governo (oeste) e outros pelos rebeldes (leste). "Ontem (quinta-feira) mais sete pessoas morreram em um bombardeio em Salhine (bairro rebelde). Uma criança foi ferida na região do peito e na cabeça. Tivemos que parar a hemorragia e fizemos uma transfusão de sangue", conta Dr. Abou Baraa.
"Tudo em vão. Ele morreu. Ia fazer seis anos".
'O mundo não faz nada'
Para o pediatra, a imagem chocante de Omran "não vai mudar nada".
"O mundo olha diariamente fotos e vídeos no YouTube de crianças resgatadas dos escombros, mas não faz nada. Contenta-se com belas palavras", lamenta.
Comovidos, os internautas compartilham uma foto-montagem que mostra a imagem de Omran sentado entre os presidentes americano e russo, Barack Obama e Vladimir Putin, mostrando que as crianças na Síria são as vítimas indefesas do jogo de poderes internacionais envolvidos no conflito. Em outra montagem, Omran está sentado na cadeira reservada para a Síria nas cúpulas da Liga Árabe, muitas vezes criticada por sua inação.
Já na caricatura do sudanês Khalid Albaih, a imagem de Omran aparece ao lado da de Aylan, o menino de três anos cujo corpo sem vida em uma praia comoveu o mundo em setembro de 2015 e cuja imagem se tornou símbolo da tragédia dos refugiados sírios.
"A escolha reservada para as crianças da Síria", foi o título dado pelo cartunista, que acrescentou: "se você ficar", sob a imagem de Omran, e "se você partir", sob a de Aylan.
'Chacoalhar as consciências'
"Esta imagem deve chacoalhar a consciência do mundo", insiste Touma.
"as crianças encontram-se na linha de fogo, porque os bombardeios visam ambulâncias, clínicas, abrigos, creches, hospitais e ruas", diz Touma,
"Há 6 milhões de crianças que precisam de assistência humanitária urgente em toda a Síria. E, das 600 mil pessoas que vivem em estado de sítio, metade delas são crianças", de acordo com Touma.

TEXTO 4 – Porque a comoção social é seletiva?
O que dá mais importância para 17 vidas francesas do que para dezenas de vidas nigerianas?
“A imensa comoção dos 12 chargistas mortos coincide com a invisibilização(sic) de quase 2 mil mortos em Baga, na Nigéria, pelo grupo Boko Karam, entre os dias 3 e 7 de janeiro e poucos meses depois da morte de 43 jovens em Ayotzinapa, todos estudantes da mesma escola. E com absoluta falta de reação midiática para a morte diária de 83 jovens negros no Brasil dos dias atuais.”
Porque a comoção social é seletiva? O que dá mais importância para 12 (agora 17) vidas francesas do que para dezenas de vidas nigerianas, mexicanas e brasileiras? Estaria a banalização do colonialismo, ou seu não reconhecimento por trás disso? Minha sensação é que vivemos em um mundo de fadas.
Há exemplos melhores para comprovar a necessidade de democratização e pluralização da mídia?
Nunca foi tão atual a afirmação de que toda a comunicação carrega consigo uma responsabilidade política.
Por um lado, a cobertura seletiva da mídia, no mundo, neste caso não é só no Brasil, aponta aqueles massacres com os quais devemos nos comover, e quais devemos ignorar. Cínico, não?
Cínico mesmo é o fato de que o humorista francês Dieudonné M'Bala M'Bala, que é conhecido por fazer piadas com judeus, ter sido preso por apologia ao terrorismo ao manifestar-se em uma rede social na internet. O mesmo já foi condenado várias vezes pela justiça francesa por suas piadas. Mas, a justiça, neste caso não teria que garantir sua liberdade de expressão com o fazia com o Charlie Hebdo?
A invocada liberdade de expressão busca justificar a postura agressiva e desrespeitosa do semanário Charlie Hebdo, para bloquear qualquer contraponto crítico à postura do jornal. Afinal, “desenhar nunca matou ninguém”!
Será que não? Será que o desrespeito continuo e cotidiano contra negros, jovens de periferia não fortalece e legitima a postura da polícia brasileiro no trato autoritário que esta destina a esta parcela da população?
Será que dizer que “Direitos Humanos” é para quem defende bandidos, não fortalece as violações de direitos que tomamos conhecimento todos os dias? Será que a homofobia não influencia no assassinato diário de vários travestis pelo país? São questões sobre as quais temos que refletir, antes de cair nos consensos que a mídia difunde como verdades absolutas. Dentre os quais a própria obstrução ao debate sobre as comunicações como se tudo o que debatesse o assunto fosse uma forma de censura.

TEXTO 5 – Mundo assiste impassível à guerra que afeta 8,4 milhões de crianças sírias
A desgraça do mundo contemporâneo não é aquela foto de tremendo impacto do menino Omran, sangue no rosto, pó de escombros cobrindo todo o corpo, olhar perdido no infinito. A verdadeira desgraça é que há, só na Síria em guerra há cinco anos, os mesmos que Omran viveu, 8,4 milhões de crianças afetadas pelo conflito. "Suas vidas estão marcadas pela violência, o medo e o deslocamento [de suas casas]", diz ao "El País" Peter Salama, diretor regional para o Oriente Médio e o Norte da África da Unicef, a agência da Organização das Nações Unidas para a infância.
Ou, posto de outra forma, há 8,4 milhões de outros potenciais Omrans que só não foram captados pelas lentes de algum fotógrafo porque o acesso a eles é complicado até para esses benditos malucos que arriscam a vida para contar, em imagens, a história, a triste história contemporânea.
Há mais desgraças envolvendo crianças na guerra da Síria: 2 milhões delas não recebem nenhum tipo de educação no país, assim como outras 700 mil que estão refugiadas em países vizinhos.
Ou seja, sofrem agora e sofrerão no futuro, mesmo que a guerra algum dia termine, porque não estarão preparadas para o mundo, seja qual for o mundo em que viverão. Temo, no entanto, que a maior desgraça nem sejam esses dados tão terríveis. O pior é que a imagem de Omran logo, logo, cairá no esquecimento, como caiu a de Alan Kurdi, menino de três anos cujo corpo foi encontrado em uma praia na Turquia, em setembro de 2015, depois do naufrágio da embarcação em que estava sua família.
Depois de Alan, milhares de outras crianças, com ou sem respectivas famílias, continuaram arriscando a vida em travessias rumo à Europa, enquanto o mundo se perdia em discussões sobre como pôr fim às migrações, em vez de discutir como abrigá-los.
Pode haver até candidatos a terroristas que se misturam aos migrantes, mas a esmagadora maioria está apenas fugindo de guerras ou de situações insuportáveis nos países de origem.
No caso da Síria, é até pior, se é que é possível. A guerra está destruindo todo um país já faz cinco anos, sem que a comunidade internacional faça qualquer coisa relevante para pôr fim à carnificina. Ao contrário, há um punhado de países que ajudam a derramar mais sangue, apoiando este ou aquele grupo envolvido nos combates.
Acho que tem razão Valdemar Cruz, do excelente jornal português "Expresso": "Assistimos à banalização de uma dor incomensurável e impossível de reduzir a uma imagem cujo significado corre o risco de se esgotar na emoção do momento, até a próxima criança, até a próxima imagem, até o próximo combate do qual resulte mais um olhar desesperado, mais um rosto a rasgar a sensibilidade das consciências. E essa é, também, uma das gritantes e deploráveis hipocrisias associadas a estes arrastões noticiosos, sobretudo quando abafam a complexidade dos conflitos onde são gerados".
Logo mais, as consciências estarão de novo anestesiadas, e os Omrans da Síria ou de outras áreas banhadas em sangue continuarão olhando perdidos para o infinito.

TEXTO 6 – Algumas charges
    

                      

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