TEXTO 1
– Fato motivador - Grupos contrários à vacinação avançam no país; movimento
preocupa Ministério da Saúde
Embora o Brasil tenha um dos mais
reconhecidos programas públicos de vacinação do mundo, com os principais
imunizantes disponíveis a todos gratuitamente, vêm ganhando força no país
grupos que se recusam a vacinar os filhos ou a si próprios.
Esses movimentos estão sendo apontados
como um dos principais fatores responsáveis por um recente surto de sarampo na
Europa, onde mais de 7 mil pessoas já foram contaminadas. No Brasil, os grupos
são impulsionados por meio de páginas temáticas no Facebook que divulgam, sem
base científica, supostos efeitos colaterais das vacinas.
O avanço desses movimentos já preocupa
o Ministério da Saúde, que observa queda no índice de cobertura de alguns
imunizantes oferecidos no Sistema Único de Saúde (SUS). No ano passado, por
exemplo, a cobertura da segunda dose da vacina tríplice viral, que protege
contra sarampo, caxumba e rubéola, teve adesão de apenas 76,7% do público-alvo.
"Isso preocupa e causa um alerta
para nós porque são doenças imunopreveníveis, que podem voltar a circular se a
cobertura vacinal cair, principalmente em um contexto em que temos muitos
deslocamentos entre diferentes países", diz João Paulo Toledo, diretor do
Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis do Ministério da Saúde,
que ressalta que todas as vacinas oferecidas no País são seguras.
A disseminação de informações contra as
vacinas ocorre principalmente em grupos de pais nas redes sociais. O Estadão
encontrou no Facebook cinco deles, reunindo mais de 13,2 mil pessoas. Nesses
espaços, os pais compartilham notícias publicadas em blogs, a maioria de outros
países e em inglês, sobre as supostas reações às vacinas --por exemplo,
relacionando-as ao autismo.
TEXTO 2–
Movimento antivacina gera surto de doenças nos EUA
Surtos de
doenças como sarampo, caxumba ou coqueluche costumam ser associados a países
pobres da África ou da Ásia, onde grande parte da população não tem acesso a
vacinação e cuidados médicos.
No
entanto, nos últimos anos essas doenças vêm ressurgindo com força nos EUA.
Somente no ano passado, foram registrados mais de 24 mil casos de coqueluche no
país, segundo dados preliminares do Centers for Disease Control and Prevention
(Centros para o Controle e a Prevenção de Doenças, ou CDC, na sigla em inglês),
ligado ao Departamento de Saúde dos EUA.
No ano
anterior, o número chegou a 48,2 mil, o maior desde 1955. Em 2013, o país
registrou ainda 438 casos de caxumba e 189 de sarampo, todas doenças que podem
ser prevenidas por vacinas existentes há vários anos.
"No
caso da coqueluche, parte dos surtos parece estar ligada ao problema de que a
vacina mais amplamente usada não é tão eficaz quanto costumava ser. Mas os
casos de caxumba e, especialmente, sarampo, acho que estão relacionados ao
movimento antivacina", disse à BBC Brasil a especialista em saúde global
Laurie Garrett, do Council on Foreign Relations (CFR).
"Os
níveis de vacinação na Grã-Bretanha para doenças como sarampo, caxumba e
rubéola vêm despencando. Há comunidades inteiras em que a cobertura está abaixo
de 50%. No caso de uma doença tão contagiosa como o sarampo, qualquer nível
abaixo de 90% é perigoso", diz Garrett.
Autismo
O
movimento antivacina ganhou força a partir de 1998, quando o pesquisador
britânico Andrew Wakefield publicou um estudo que relacionava a vacina Tríplice
Viral (contra sarampo, caxumba e rubéola) ao autismo.
Diversas
pesquisas posteriores nunca acharam qualquer ligação entre a vacina e o
autismo, e em 2010 uma comissão de ética descobriu que Wakefield havia
falsificado dados de seu estudo. Wakefield teve sua licença médica cassada e o
estudo foi retirado das publicações.
Mas apesar
do descrédito do estudo e de seu autor, a teoria se espalhou, com a ajuda da
internet, entre pais temerosos de que a vacina pudesse causar problemas a seus
filhos.
Número de vacinas
Fisher diz
que seu objetivo não é convencer pais a não vacinarem seus filhos, mas lutar
pelo direito à informação.
"Queremos
educar as pessoas para que entendam sobre os riscos de complicações das
vacinas, para que possam tomar decisões bem informadas", disse Fisher à
BBC Brasil.
Assim como
outros adeptos do movimento, Fisher reclama do poder da indústria farmacêutica
e do número de vacinas recomendadas pelo governo americano.
"Esse
número triplicou nos últimos 30 anos. Em 1982, eram 23 doses de sete diferentes
vacinas até os seis anos de idade. Hoje, o governo recomenda 69 doses de 16
vacinas até os 18 anos", afirma.
As
crianças americanas são obrigadas a apresentarem comprovante de vacinação para
ingressar na escola. Mas todos os 50 Estados do país permitem isenções médicas,
para crianças que, por motivos de saúde, não podem ser vacinadas.
Perfil
"Estudos
mostram que muitas crianças não vacinadas têm pais com altos níveis de educação
e renda", disse à BBC Brasil a epidemiologista Allison Fisher, do CDC.
Uma
análise das áreas onde ocorrem os surtos também dá dicas sobre o perfil das
famílias que optam por não vacinar seus filhos.
"Se
nosso mapa interativo englobasse os anos 1950, veríamos que, naquela época, os
surtos estavam associados à falta de infraestrutura para levar as vacinas às
crianças pobres", diz Garrett.
"Isso
não ocorre mais. Atualmente o governo federal dos EUA e a maioria dos governos
estaduais têm programas de vacinação muito fortes nas comunidades carentes e
áreas rurais", afirma.
"Hoje, os surtos nos EUA ocorrem entre
populações mais ricas. E isso tem relação com comunidades em que há
maior pressão política para acabar com as exigências de vacinação para crianças
na escola", diz Garrett.
Riscos
Segundo
Allison Fisher, do CDC, como certas doenças não eram vistas havia muito tempo
nos EUA, alguns pais simplesmente pensam que elas não existem mais.
"Tentamos
chegar aos pais e profissionais de saúde e reforçar que a decisão de não
vacinar traz riscos", diz.
Garrett
observa que, antes da introdução das vacinas, doenças como sarampo estavam
entre as principais causas de morte de crianças nos EUA.
"É
imperdoável que hoje em dia, em um país como os EUA, uma criança pegue
sarampo", afirma.
"A
ironia é que você volta aos EUA e ouve todas essas pessoas dizendo: 'Não
queremos vacinas'."
TEXTO 3–
'Festas da catapora' são populares nos EUA
Comuns até
meados dos anos 1990, antes da introdução da vacina, as chamadas "Festas
da Catapora" continuam a ganhar adeptos nos EUA. Auxiliados pela internet,
pais de todos os cantos do país trocam informações sobre como colocar seus
filhos em contato com crianças infectadas pelo vírus causador da catapora – ou
varicela (Varicela-Zóster).
O objetivo
é tentar fazer com que os filhos contraiam uma doença que, acreditam, se
manifesta de forma bem mais branda em crianças do que em adultos, e fiquem
assim imunizados para o resto da vida.
Para
muitos pais, expor os filhos à doença "naturalmente" é menos
arriscado do que optar pela vacina.
"Somos
um grupo nacional de pais unidos no apoio ao vírus da catapora na infância em
vez da vacina", diz a apresentação da página Pox Party USA, no Facebook.
Na página,
uma das várias dedicadas ao tema na rede social, integrantes trocam dicas sobre
as "Festas da Catapora" mais próximas de onde moram e debatem prós e
contras da vacina e de contrair a doença.
"Este
é um grupo para indivíduos/famílias que, por diversos motivos pessoais,
preferem a exposição natural à catapora do que a vacina contra a
varicela", afirma outro grupo, Chicken Pox Parties – Southeast US.
Pirulitos
Além do
temor de que a vacina possa provocar efeitos colaterais graves – o que, segundo
especialistas, não tem comprovação científica –, alguns pais questionam sua
eficácia. O Centers for Disease Control and Prevention (Centros para o Controle
e a Prevenção de Doenças, ou CDC, na sigla em inglês), agência ligada ao
Departamento de Saúde dos EUA, afirma que a eficácia da vacina é de 98%.
Mas o fato
de serem recomendadas duas doses – a primeira dos 12 aos 15 meses e a segunda
dos quatro aos seis anos de idade – provoca desconfiança em certos pais, que
acham mais seguro garantir a imunidade contraindo a doença.
Há
inclusive os que recorrem a outros métodos, como enviar ou receber pelo correio
pirulitos lambidos ou roupas usadas por crianças infectadas.
A prática
ganhou as manchetes há cerca de dois anos, quando autoridades tiveram de
alertar que quem enviasse materiais do tipo pelo correio estaria infringindo a
lei e sujeito a pena de prisão.
Riscos
"Alguns
pais acham que a vacina contra varicela não é necessária, porque lembram que
tiveram a doença quando crianças e, apesar do desconforto, ficaram bem",
disse à BBC Brasil a epidemiologista Allison Fisher, do CDC.
"Acham
que contrair a doença naturalmente é melhor que a vacina", afirma Fisher.
"É nossa função alertá-los sobre os riscos de não vacinar."
Seja na
forma de "Festas da Catapora" ou do compartilhamento de pirulitos,
especialistas afirmam que expor as crianças ao vírus propositalmente é
arriscado.
De acordo
com o CDC, até o início dos anos 1990 a doença atingia uma média de 4 milhões
de pessoas por ano nos EUA. Destas, entre 10,5 mil e 13 mil tinham de ser
hospitalizadas e entre cem e 150 morriam a cada ano.
TEXTO 4–
A nova revolta da vacina
Ao lado
dos antibióticos, as vacinas estão entre as grandes conquistas da medicina.
Desde que o médico britânico Edward Jenner decidiu inocular um garoto de sete
anos com o conteúdo extraído de uma pústula de varíola, em 1796, e descobriu
que isso garantia proteção contra a enfermidade, as doenças infecciosas
passaram a figurar entre aquelas contra as quais a ciência finalmente possuía
alguma forma de controle.
SURTOS CATASTRÓFICOS
A
responsabilidade dos anti-vacina no recrudescimento no número de casos de
doenças preveníveis voltou à discussão com o surto de sarampo enfrentado na
Europa, com sete mil pessoas contaminadas, e em Minnesota, nos Estados Unidos.
Desde abril, foram registrados por lá 69 casos da doença. Desses, 65 ocorreram
em crianças que não foram imunizadas e um atingiu um bebê que havia recebido
apenas uma das duas doses recomendadas.
POR QUE AS VACINAS SÃO IMPORTANTES
– Elas
estão entre as principais conquistas da medicina, ao lado dos antibióticos
–
Derrubaram o número de casos de doenças infecciosas graves e são responsáveis
pela erradicação de outras, como a varíola
– Protegem
o indivíduo e também a comunidade
COMO A CIÊNCIA RESPONDE AOS ARGUMENTOS DO
MOVIMENTO ANTI-VACINA*
A imunidade
natural seria superior à induzida pela vacina
Não é
razoável pensar em expor as crianças à doenças como sarampo para que adquiram
imunidade. Depois, as vacinas oferecem imunidade duradoura e eficiente, embora
algumas precisem de reforço
Não há
evidência cientificamente sustentável de que isso ocorra
Há
presença de mercúrio, que poderia prejudicar o desenvolvimento
O metal é
encontrado somente em frascos de múltiplas doses. E estudo do Centro de
Controle de Doenças, com mais de 1000 crianças acompanhadas, não encontrou
diferença neurológica, psicológica ou de desenvolvimento nas que receberam
maiores quantidades de mercúrio
Elas
enfraquecem o sistema imunológico
Algumas
podem causar suspensão temporária de respostas imunes, mas elas são de curta
duração e não aumentam risco de infecção por outros agentes infecciosos
TEXTO 5 – Desabafo contra o movimento anti-vacina
Uma mãe
americana intensificou o debate entre os que são a favor e contra a
obrigatoriedade da vacinação de crianças após postar no Facebook um desabafo
sobre o perigo que sua filha, Ashley, correu ao ser exposta a uma criança com
varicela, não vacinada. Ashley, de 11 anos, precisou realizar um transplante de
rim quando tinha apenas 2 anos de idade, e isso a impede de tomar vacinas com
vírus vivo, como é o caso da vacina contra varicela. Assim, basta uma pessoa
aderir ao movimento antivacina e deixar de tomar as doses necessárias para que
a menina fique ameaçada.
Por causa
da exposição desnecessária à doença, Ashley foi parar na emergência. A mãe, a
enfermeira Camille Echols, postou que tem visto na internet "memes
pseudo-inteligentes questionando: 'por que meus filhos não vacinados seriam uma
ameaça para seus filhos vacinados, se você tem tanta certeza de que eles
funcionam?'". Em seguida, ela explicou que algumas crianças, como a
própria filha, são imunodeprimidas e, caso se exponham ao vírus presente na
vacina, não desenvolverão anticorpos, mas sim a própria doença.
"Ela
chegou a tomar uma dose da vacina contra varicela, mas não conseguiu tomar a
segunda porque ela estava imunossuprimida [por causa do transplante] e, em vez
de desenvolver imunidade, ela teria contraído o vírus", afirmou Camille.
Sete dias
depois de a criança dar entrada na emergência, ela está considerada saudável,
sem sinal de ter contraído varicela. A mãe fez um post de agradecimento em suas
redes sociais àqueles que desejaram sorte.
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