domingo, 5 de junho de 2016

Aula 14/2016 - Sobre a cultura do estupro


MATERIAL DA AULA

TEXTO 1 – FATO MOTIVADOR - MEDO TORNA ESTUPRO COLETIVO O ‘CRIME MAIS SUBNOTIFICADO’ NO PAÍS
Uma das poucas mulheres à frente de associações de delegados no país, a gaúcha Nadine Anflor, 39, diz que estupros coletivos como o registrado no Rio de Janeiro não são tão raros como se imagina. O medo dos vários agressores, diz, torna o crime o mais subnotificado entre as violências contra a mulher.
"Se a mulher tem medo de denunciar quando é estuprada por um, imagina por 30. Então, acho que a subnotificação é muito mais alta no caso dos estupros coletivos", diz, referindo-se ao caso da jovem de 16 anos estuprada por 30 homens no Rio.
Em entrevista à BBC Brasil, Anflor também defendeu a atuação de Alessandro Thiers, delegado afastado da investigação do delito após ser acusado de conduta inadequada e machismo. Para ela, Thiers não "pecou" ao dizer que estava investigando a existência do estupro e fez as perguntas "de praxe" nos depoimentos.
"Infelizmente, o combate à violência contra a mulher está dependendo muito da força de cada uma."
Leia a seguir os principais trechos da entrevista.
àBBC Brasil: O atendimento à jovem de 16 anos que foi estuprada por vários homens no Rio foi bastante criticado. O que falta para melhorar atender as vítimas de violência sexual?
àBBC Brasil: O estupro coletivo é um crime comum?
àBBC Brasil: No caso do no Rio, o delegado que primeiro assumiu a investigação foi criticado por perguntar à jovem se ela costumava praticar de sexo grupal. Como avalia a atuação dele?
àBBC Brasil: O delegado também foi criticado por, mesmo com vídeos e a palavra da vítima, não confirmar a existência do crime. Essa ponderação é correta?
àBBC Brasil: Quais são os principais problemas nas delegacias quanto ao atendimento dessas vítimas?
àBBC Brasil: Quais são as diferenças do atendimento?
àBBC Brasil: Há pouca atenção do Estado para o combate à violência sexual?
àBBC Brasil: Como vê aprovação da lei que aumenta a pena pelo crime de estupro? O que ainda falta fazer?
àBBC Brasil: Você define esses estupradores como "doentes". Os que participaram do estupro coletivo no Rio se encaixam nesse perfil?
àBBC Brasil: O exame de corpo de delito da jovem de 16 anos não mostrou sinais de estupro. A delegada Cristina Bento disse que o laudo é um indício importante, mas não essencial. Qual é a importância dele na investigação?

TEXTO 2 – O ESTUPRO
Uma em cada cinco mulheres será violentada sexualmente durante a vida. Será que a ciência pode explicar a mais repulsiva das agressões?
Cena 1 - (Paris, França):
Após brigar com o namorado, Alex decide voltar sozinha para casa no meio da madrugada. Diante de uma avenida de alta velocidade, ela resolve usar uma passagem subterrânea para pegar um táxi. No túnel escuro, ela caminha até ser surpreendida por um homem espancando um travesti. Alex fica paralisada, não sabe se tenta terminar a travessia ou volta por onde entrou. Os segundos de incerteza são cruciais e o homem a vê. E se interessa. Ela ainda tenta fugir. Mas é agredida, humilhada, estuprada e espancada quase até a morte.
Cena 2 - (São Paulo, Brasil):
Joana conhece Cristiano em uma festa. Eles dançam, trocam beijos e telefones. Alguns dias depois ela resolve passar na casa dele. Mas, em vez de curtir a garota, Cristiano, embalado por dois amigos, topa dividi-la em um "ménage à quatre". O plano parece simples. No meio da transa, os dois amigos sairiam nus de dentro do armário, tentariam participar da brincadeira e, quem sabe, convencê-la a transar com eles também. Mas Joana não gosta da idéia, resiste às investidas dos dois intrusos, tenta se desvencilhar, grita, apanha, mas não consegue evitar - é estuprada pelos três ao mesmo tempo.
Cena 3 - (Freetown, Serra Leoa):
Forças rebeldes invadem a cidade. A apenas 40 quilômetros dali, a pequena vila de Mamamah é alvo fácil dos revolucionários, que executam a maioria dos moradores e raptam as adolescentes. Mariatu, de apenas 16 anos, é pega após seus pais serem mortos. É estuprada repetidas vezes por todos os homens do grupo. Dezenas de garotas da tribo têm o mesmo destino. Quando tenta resistir, Mariatu é punida com jejum e espancamento. É forçada a acompanhar as forças rebeldes e eventualmente vira "esposa" de algum deles. Quando engravida, é abandonada.
Os exemplos que você acabou de ler foram retirados, respectivamente, dos filmes: Irreversível e Cama de Gato e do site da Anistia Internacional. Seja no cinema ou nos apelos das organizações humanitárias, o relato é da mesma situação cruel, fria e revoltante que atinge milhões de mulheres - segundo a Organização Mundial da Saúde, uma em cada cinco mulheres foi ou será estuprada. São agressões cometidas por maridos, namorados, amigos. Por estranhos que não fazem distinção entre mulher bonita ou feia. Por soldados e rebeldes em situações de guerra. Mas por quê? Como a ciência explica esse comportamento que existe desde os primórdios da humanidade e nos deixa em condições tão próximas da de animais? Selecionamos alguns dos principais tópicos dessa discussão.
Por que alguns homens buscam sexo forçado?
Estuprar é da natureza humana?
O que um estuprador tem de diferente?
Todos os tipos de estupro são iguais?
Os casos de estupro no reino animal
TEXTO 3 – 7 NOTÍCIAS SOBRE ESTUPRO PARA DESFAZER TEORIA DE QUE 'A CULPA FOI DELA'
Após a denúncia de que uma jovem de 16 anos foi estuprada por mais de 30 homens no Rio de Janeiro, comentários em notícias e nas redes sociais questionam se a adolescente não poderia ter evitado o crime de que foi vítima.
De alguma maneira, a ideia é compartilhada por 58,5% dos brasileiros, segundo pesquisa do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) divulgada em 2014. A maioria dos entrevistados concordou total ou parcialmente com a afirmação de que "Se as mulheres soubessem como se comportar, haveria menos estupros".
O UOL listou algumas notícias sobre casos ocorridos em todo o Brasil contra mulheres que estavam na escola, na universidade, no médico, a caminho do trabalho, ou que foram violentadas por parentes ou conhecidos.
Em outro estudo do Ipea, a partir de dados de 2011 do Sinan (Sistema de Informações de Agravo de Notificação do Ministério da Saúde), estima-se que no mínimo 527 mil pessoas são estupradas por ano no Brasil.
Relembre alguns casos de estupro
Dentro da escola
"Por que você fez isso? Não sabe o lixo que estou me sentindo." É assim que uma estudante de 12 anos falou com um dos três adolescentes que a teriam agredido dentro do banheiro de uma escola estadual, no Jardim Miriam, na zona sul de São Paulo, em maio de 2015. "Vocês acabaram comigo. Infelizmente, eu nunca mais vou esquecer isso", disse a jovem.
Dentro da universidade
Uma estudante da USP foi estuprada durante uma festa da Faculdade de Medicina. A vitima diz ter desmaiado após ingerir uma bebida oferecida pelo réu. "Ele tampou minha boca e pegou parte do nariz. Não respirava direito", contou. O aluno de medicina a levou para a Casa do Estudante, residência universitária, e a violentou. O caso aconteceu em 2012, mas só foi levado à Justiça em 2015.
No consultório médico
Um nutrólogo foi preso em Florianópolis acusado de estuprar 14 pacientes nos últimos três anos. O médico tocava as costas e os seios das pacientes com argumento de examiná-las, mas, em seguida, forçava beijos e carícias. Algumas mulheres conseguiram escapar, outras foram dopadas e estupradas no consultório, segundo as informações da polícia.
Na casa do tio
Uma criança de sete anos foi estuprada pelo tio, no sertão de Pernambuco. De acordo com a Polícia Militar, os pais da menina informaram que a criança saiu para brincar na casa do acusado que seria marido da tia dela. Um pouco depois a criança teria voltado sangrando. O acusado seguiu atrás da garota afirmando que ela teria menstruado. Após ter sido levada para o hospital foi constatado o estupro.
Perto do trabalho
Uma guarda municipal foi esfaqueada durante uma tentativa de estupro no Rio de Janeiro. A jovem de 29 anos foi atacada pela dupla, que chegou em um carro e fez a abordagem perto do quartel general da guarda, em São Cristóvão, zona norte da cidade. A vítima foi levada para uma região de mata e, ao reagir, levou duas facadas nas costas - uma perfurou o pulmão.
Pelo padrasto
Maria Alice Seabra, 19, foi sequestrada, estuprada e morta pelo padrasto, o auxiliar de pedreiro Gildo da Silva Xavier, 34. Ele confessou ter forçado a vítima a beber Rupinol (medicamento usado para aplicar golpes como o "boa noite Cinderela"). Após espancar Maria Alice, ele a colocou no banco de trás do veículo e tentou estrangulá-la com o cinto de segunça. Em seguida, decidiu estuprá-la ainda dentro do carro, às margens da BR-101 Norte, próximo ao bairro de Paratibe, em Paulista
Por um policial
Um policial militar de 39 anos, do 17º Batalhão da PM do Rio. O cabo é acusado de sequestrar e estuprar uma mulher de 21 anos, na zona oeste do Rio. Ele chegou a ser detido, mas não foi algemado e conseguiu fugir enquanto a ocorrência era registrada, embora houvesse seis policiais civis na delegacia.

TEXTO 4 – “DROGAS DO ESTUPRO” ESTÃO CADA VEZ MAIS DISSEMINADAS
Existem mais de 90 substâncias usadas por agressores para subjugar as vítimas
Em um momento de descuido, Talita (nome fictício), 23, notou que não estava normal. Era um show de rock em São Paulo, há três anos. Ela se sentiu tonta, sonolenta e não conseguia falar. A última coisa de que se lembra é de um desconhecido perguntando se ela estava bem. No outro dia, Talita acordou sozinha em um quarto de motel. Com dores pelo corpo, tinha certeza de que tinha sido violentada, mas não se lembrava por quem, nem como.
Assim como boa parte das vítimas de violência sexual no Brasil, ela não prestou queixa por medo dos julgamentos. Neste mês, o caso do estupro coletivo da adolescente carioca de 16 anos, filmado e publicado nas redes sociais, chocou o país. Casos como esses são frequentes no Brasil e na América Latina, onde mulheres e adolescentes são dopadas para não reagir a um estupro.
Em Minas, de janeiro a maio, mais da metade (54%) das vítimas de violência sexual tinham menos de 18 anos – 438 pessoas foram estupradas no período no Estado. Em São Paulo, de janeiro a abril, houve ao menos um caso por dia de estupro de vulnerável.
A delegada Luciana Libório, da Delegacia Especializada no Combate à Violência Sexual, afirma que esses casos são frequentes. “Chegam à delegacia denúncias em que a vítima acredita que tenha sido drogada. Nessas ocorrências, pedimos um exame toxicológico feito pela Polícia Civil por meio da coleta da urina da vítima para verificar se há algum indício de drogas. Com a confirmação, podemos falar de estupro de vulnerável”, explica.
As substâncias usadas por agressores para deixar a vítima vulnerável são conhecidas como “drogas do estupro”. Geralmente sem cor, gosto e cheiro, agem no sistema nervoso central e deixam pessoa sonolenta e inconsciente. A Organização das Nações Unidas (ONU) alertou recentemente sobre o crescimento rápido dessas drogas e o surgimento de outras substâncias do tipo. Segundo a entidade, remédios utilizados em prática de violência sexual são de fácil acesso.
De acordo com o médico André Valle de Bairros, professor de toxicologia clínica da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), mais de 90 substâncias podem ser utilizadas com o intuito deixar a vítima incapaz de reagir. “As drogas do estupro mais comuns no mundo são álcool, GHB (ácido gama-hidroxibutírico ou ‘ecstasy líquido’), flunitrazepam (Rohypnol) e quetamina. Entretanto, existem outras que, misturadas ao álcool ou ingeridas em grandes quantidades, são capazes de gerar uma submissão química da vítima, como, por exemplo, os anti-histamínicos, como a difenidramina (Dramin)”.
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O velho clichê de “tomar conta do seu copo em festas” serve como prevenção, pois as drogas do estupro precisam ser ingeridas para surtir efeito. Embora a cultura do estupro possibilite casos como de Talita, de Diana e da garota do Rio de Janeiro, o cuidado é fundamental.
Já para a indústria farmacêutica, a ONU recomenda que medidas de segurança sejam desenvolvidas (por exemplo, adicionar cores e sabores a essas drogas). Entretanto, isso ainda não é feito. (MA)

TEXTO 4 – Dados nacionais sobre violência contra as mulheres
Apesar de ser um crime e grave violação de direitos humanos, a violência contra as mulheres segue vitimando milhares de brasileiras reiteradamente: 38,72% das mulheres em situação de violência sofrem agressões diariamente; para 33,86%, a agressão é semanal. Esses dados foram divulgados no Balanço dos atendimentos realizados de janeiro a outubro de 2015 pela Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180, da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República (SPM-PR).
Dos relatos de violência registrados na Central de Atendimento nos dez primeiros meses de 2015, 85,85% corresponderam a situações de violência doméstica e familiar contra as mulheres.
Em 67,36% dos relatos, as violências foram cometidas por homens com quem as vítimas tinham ou já tiveram algum vínculo afetivo: companheiros, cônjuges, namorados ou amantes, ex-companheiros, ex-cônjuges, ex-namorados ou ex-amantes das vítimas. Já em cerca de 27% dos casos, o agressor era um familiar, amigo, vizinho ou conhecido.
Em relação ao momento em que a violência começou dentro do relacionamento, os atendimentos de 2014 revelaram que os episódios de violência acontecem desde o início da relação (13,68%) ou de um até cinco anos (30,45%).
Dos 4.762 homicídios de mulheres registrados em 2013, 50,3% foram cometidos por familiares, sendo a maioria desses crimes (33,2%) cometidos por parceiros ou ex-parceiros. Isso significa que a cada sete feminicídios, quatro foram praticados por pessoas que tiveram ou tinham relações íntimas de afeto com a mulher. A estimativa feita pelo Mapa da Violência 2015: homicídio de mulheres no Brasil, com base em dados de 2013 do Ministério da Saúde, alerta para o fato de ser a violência doméstica e familiar a principal forma de violência letal praticada contra as mulheres no Brasil.

TEXTO 6 – TIRINHA


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