quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Aula 24/2016 - A vaquejada e o limite entre a cultura e os maus tratos




Material da aula

TEXTO 1 – Fato motivador – Juiz nega liminar que pedia proibição de vaquejada em parque na Paraíba
O juiz Max Nunes de França negou na quarta-feira (12) um pedido de liminar que pedia a proibição da realização da 39ª edição da vaquejada do parque Maria da Luz, que começa nesta quinta-feira (13) na Zona Rural de Massaranduba, no Agreste paraibano. Segundo o magistrado, os organizadores do evento garantem o bem-estar dos animais.
O pedido partiu do grupo Harmonia dos Protetores Independentes dos Animais (Harpia). A entidade alegou que, mesmo sendo uma atividade cultural, causa maus tratos com osanimais que são usados. O grupo ainda cita uma decisão monocrática do Supremo Tribunal Federal (STF) que declarou ilegal uma lei estadual do Ceará que regulamenta a vaquejada.
Na decisão, o juiz Max Nunes França diz que ''impedir liminarmente a realização de um evento que já se encontra em sua 39° edição, às vésperas de sua realização, pode causar um perigo de dano inverso, já que as consequências de seu cancelamento se mostram muito mais evidentes pela dimensão de sua organização, ressaltando que não ficou demonstrado a verossimilhança da crueldade alegada''.
Para o magistrado, o julgamento do STF ainda não é definitivo e o acórdão não foi publicado e, portanto, ''se desconhece qual será o alcance da decisão''. O G1 entrou em contato com o Harpias para saber se a entidade vai tomar alguma providência sobre a decisão, mas as ligações não foram atendidas até as 10h55 desta quinta-feira.

TEXTO 2 – STF decide que tradicional prática da vaquejada é inconstitucional
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quinta-feira (6) derrubar uma lei do Ceará que regulamentava a vaquejada, tradição cultural nordestina na qual um boi é solto em uma pista e dois vaqueiros montados a cavalo tentam derrubá-lo pela cauda.
Por 6 votos a 5, os ministros consideraram que a atividade impõe sofrimento aos animais e, portanto, fere princípios constitucionais de preservação do meio ambiente.
O governo do Ceará dizia que a vaquejada faz parte da cultura regional e que se trata de uma atividade econômica importante e movimenta cerca de R$ 14 milhões por ano. Apesar de se referir ao Ceará, a decisão servirá de referência para todo o país, sujeitando os organizadores a punição por crime ambiental de maus tratos a animais.
Caso algum outro estado tenha legalizado a prática, outras ações poderão ser apresentadas ao STF para derrubar a regulamentação.
O julgamento começou em agosto do ano passado. Em seu voto, Marco Aurélio considerou que a proteção ao meio ambiente, neste caso, deveria se sobrepor ao valor cultural da prática.
O ministro detalhou que, no evento, o boi é enclausurado, açoitado e instigado a correr, momento em que um dupla de vaqueiros montados a cavalo tenta agarrá-lo pela cauda. O rabo do animal é torcido até que ele caia com as quatro patas para cima.
"Ante os dados empíricos evidenciados pelas pesquisas, tem-se como indiscutível o tratamento cruel dispensado às espécies animais envolvidas. Inexiste a mínima possibilidade de um boi não sofrer violência física e mental quando submetido a esse tratamento", disse à época.
Nesta quinta, a presidente do STF, ministra Carmen Lúcia, elogiou a ação de inconstitucionalidade proposta pela Procuradoria Geral da República.
"Sempre haverá os que defendem que vem de longo tempo, se encravou na cultura do nosso povo. Mas cultura se muda e muitas foram levadas nessa condição até que se houvesse outro modo de ver a vida, não somente ao ser humano", disse a ministra.

TEXTO 3 – Ao considerar vaquejada ilegal, STF faz imposição ideológica
A tradição cultural da vaquejada, como festa popular de grande preferência pela população no Nordeste e que não implica em maus-tratos, tortura ou morte de animais, deveria prevalecer como saudável manifestação festiva regional brasileira, que constitui bem cultural popular e histórico já incorporado ao patrimônio cultural do povo nordestino.
A vaquejada é uma modalidade de esporte próprio da vida rural que, a exemplo do hipismo e do turfe, envolve a participação conjunta do homem (ou mulher) e do animal –no caso da vaquejada, do cavalo e do boi simultaneamente. Os cavaleiros competem em duplas, cavalgando seus equinos cuidadosamente arriados, correm em uma raia de aproximadamente 100 metros de comprimento com piso macio, objetivando derrubar o garrote ou touro que parte celeremente da porteira de saída, buscando fugir de sua prisão e devendo ser derrubado pelo vaqueiro mediante puxada pelo rabo até o limite final da pista. Ao lado dessa pista, acomodam-se os torcedores.
Muito diferente é o que se passava com a "Rinha de Galo" e a "Farra do Boi", que  –para o horror de muitos, embora para a exploração econômica fria e desfrute sádico de poucos– expunham os animais a cenas de violência e morte, tradições de culturas bárbaras que a ética da paz e do respeito à vida não comportam jamais. Justa e oportuna foi a proibição desses espetáculos típicos de violência, que resultavam sempre em morte cruel aos animais.
Diferente, e muito, é o caso da vaquejada, na qual não se mata nem se fere o animal. Antes, além do cavalo, o garrote é também olhado e admirado pelos espectadores e vaqueiros pela sua beleza física, força e velocidade.
A vaquejada evoca também a prática da cultura e do modelo histórico da atividade pecuária e de relação homem-animal nordestina de pastoreio aberto, que exigia a tarefa pelo vaqueiro de acompanhamento, busca e recolhimento da rês, já que a criação se fazia livremente em campos abertos e sem cercados, nos vastos sertões nordestinos. Gerou-se assim um verdadeiro "ethos social" para o bom vaqueiro, que jamais deixaria abandonada ou perdida na vastidão dos campos agrestes e secos qualquer rês confiada aos seus cuidados. Era uma questão de dignidade profissional e verdadeira questão de honra.
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Importante destacar que houve nos últimos anos um forte e inegável aprimoramento na organização e disciplina para essa prática desportiva, notadamente no tocante à proteção da saúde e do bem-estar dos animais envolvidos no desporto –assegurando-se que a integridade física e o bom trato dos animais sejam rigorosamente assegurados em todas as etapas do evento–, bem como a proibição de uso de quaisquer instrumentos agressores.
Destarte, vê-se que vaquejada é um espetáculo esportivo e uma festa de grande atração popular típica, evidenciando-se assim como mais uma autêntica expressão da rica diversificação cultural das diversas macrorregiões do Brasil e do admirável patrimônio cultural nordestino e brasileiro, sendo, portando, digna de receber o estímulo e a proteção do Estado.
Com a regulamentação da vaquejada como prática desportiva e cultural pelo STF, qualquer evento precisaria estar devidamente organizado, evitando-se, o descumprimento do dispositivo constitucional que veda (art. 225, parágrafo 1°, inciso VII) a submissão dos animais à crueldade. Assim, havendo vaquejada na qual os animais eventualmente sofressem maus tratos, estas seriam banidas, merecendo os seus responsáveis punição exemplar.
Todavia, a decisão do STF foi no sentido do resultado de uma imposição ideológica, pura e simples. A vaquejada foi alvo por ter ficado suficientemente vulnerável, e, ainda discriminada por ser uma demonstração cultural e esportiva tipicamente do interior nordestino!

TEXTO 4 – Vaquejadas: manifestação cultural ou cultura dos maus-tratos?
A vaquejada é um esporte – pelo menos segundo alguns -, e um lucrativo negócio também, em que dois vaqueiros à cavalo puxam o rabo de um boi para derrubá-lo em um local previamente estabelecido. Nesta competição ou celebração da cultura do cabra-macho, o boi, e muitas vezes, meros bezerros, é um objeto a ser derrotado, entenda-se violentado, pela força e a habilidade das “puxadas” dos vaqueiros, munidos da energia de cavalos velozes e fortes. É um “jogo” desigual: um boi contra dois vaqueiros e dois cavalos.
A vaquejada expõe o animal a inúmeras condições de maus-tratos: o animal encarcerado e submetido a chutes e chicotadas em algumas partes do corpo, inclusive, nos testículos, para que o bicho fique afoito e aumente o grau de dificuldade para os concorrentes. Nesta perspectiva, é impossível não imaginar que não há envolvimento de muito sofrimento ao animal.
O animal é, nesse tipo de prática “esportivo-cultural”, reduzido a mero meio para satisfazer dois propósitos – vaidades – humanos. Um mais particular e outro mais geral. O primeiro, a diversão, o espetáculo. O segundo, mais geral e menos consciente, é atestar a superioridade do homem sobre a natureza e os outros animais. O problemático aqui é que, nesse ritual que é a vaquejada, a diversão é ao custo do sofrimento do animal e a dita superioridade do homem é provada e conquistada pela força, pela capacidade de infligir dor e submissão.
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O argumento de que a vaquejada é uma manifestação cultural não implica aceitar os elementos de violência, crueldade e as condições de sofrimento a que os animais são expostos. Por vezes, a palavra “cultura” ou adjetivo “cultural” encobrem equívocos e violências aos quais se tenta justificar e tornar intocável práticas e hábitos assim qualificados. Por exemplo, práticas de infanticídios e mutilamento genital seriam relativizadas por serem práticas culturais de um determinado povo. Logo, segundo esse raciocínio, qualquer intervenção ou crítica seria um equívoco de indisfarçável etnocentrismo travestido de boas razões humanitárias e civilizatórias. Não se trata apenas de uma concepção congelada e imóvel da cultura, como se esta fosse uma entidade estanque, autoreferente, fechada e incapaz de aprender e redefinir suas crenças, representações e práticas. O problema é também que a ideia – cultura – que deveria constituir a base para desnaturalizar os fenômenos humanos, de que estes são mutáveis, modificáveis e dependem da ação das pessoas, acaba por ser utilizado como discurso que referenda e reforça naturalizações, justificando e perpetuando violências, dominações e desigualdades hierárquicas cuja existência é arbitrária.
O importante, do ponto de vista de uma sociedade democrática madura e reflexiva, é que o fato de certas manifestações, crenças ou práticas constituírem traços de uma cultura particular não sirvam como uma maneira de neutralizar e blindar estas contra questionamentos e interpelações públicas, quer visem tais sua supressão ou ajustamento. A prática da vaquejada precisa ser discutida publicamente quanto aos seus traços e elementos perversos e desnecessariamente violentos.
Ora, esta pacificação deve passar também pelos esportes em que o homem estabelece relação com outros animais. A mudança de viés deve contemplar também o modo como nos relacionamos com a natureza. Não é possível, em pleno século XXI, promover mais um tipo de diversão em que o centro da ação lúdica se estabelece com o sofrimento de um animal.

TEXTO 5 – Consigo pensar em poucas coisas mais bestas do que a tal vaquejada
Dois homens montados a cavalo emparelham ao lado de um boi até conseguir derrubá­lo no chão. Consigo pensar em poucas coisas mais bestas do que a tal vaquejada, que provocou na internet uma onda de manifestações tão selvagens quanto o próprio evento, depois de uma decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) que proíbe a realização delas no Estado do Ceará.
Foi um flá­flu raivoso entre pessoas contra e a favor da decisão do Supremo. A turma do contra tem, sem dúvida, o melhor e mais simples argumento. É inaceitável que nos dias de hoje ainda sejam permitidos eventos que exploram os animais por pura e simples diversão e, pior, tenham a chancela esportiva para justificar sua existência.
Os argumentos do pessoal do contra são apenas risíveis. "Esse Brasil que não conhece a vida no campo, fica achando tudo desumano". "É algo cultural do Nordeste, não pode ser proibido". Dá para entender porque tanta gente está esperneando, são cerca de 4 mil provas, 700 mil empregos diretos e movimento de 600 milhões de reais por ano, prêmios que chegam a R$ 300 mil a cada edição, de acordo com a Associação Brasileira de Vaquejada (ABVAQ). Para esse pessoal é muito dinheiro para ficar com pena do boi.
Mas apelar para a questão cultural não é suficiente para legitimar tradições. Dezenas delas são apenas maus tratos de animais. E há uma onda positiva no mundo de colocar em xeque a validade de parques, zoológicos e eventos que só existem para diversão das pessoas. Para quem não viu, indico "The Cove" e "Blackfish", documentários que mostram os bastidores sombrios dos shows de golfinhos e orcas.
Tradições existem para serem mudadas. Em 2010, a região da Catalunha, na Espanha, proibiu a realização de touradas, uma "tradição" de séculos no país. Mas outro patrimônio espanhol continua firme, forte e sanguinolento, a famosa corrida de touros de São Firmino, em Pamplona, que tem similares em outras cidades do país.
Os touros são soltos em ruas estreitas no meio da multidão, que usa lenços vermelhos para atiçar os animais. A brincadeira termina com a morte do touro. Neste ano, pelo menos dois infelizes foram chifrados pelos animais e morreram. Se é para torcer por alguém, que seja pelo touro. No Brasil, há uma lista de eventos que deveriam entrar em extinção. No final de 2015, a CPI que investiga casos de maus tratos de animais apresentou parecer final à comissão em que recomendava a proibição do uso de animais em rodeios, vaquejadas, além do endurecimento das penas para quem promove rinhas de galo, que já são proibidas.
Por pressão de deputados da bancada ruralista, o relatório final, entregue em fevereiro, foi concluído sem os trechos que criticam e pediam exatamente a proibição desse tipo de evento. "Se proibirmos isso, vamos tirar a alma do interior", disse o deputado Adilton Sachetti (PSB­MT).
Embora essa decisão do STF só sirva para o Ceará, a medida pode abrir caminho para que a vaquejada seja proibida em outros Estados. Está mais do que na hora de acabar com mais essas farras do boi. A legítima, realizada no litoral de Santa Catarina, foi proibida em 1998, mas ainda acontece clandestinamente. Esse ano, um homem foi morto pelo animal, que logo depois foi sacrificado. Lamento pelo boi.

TEXTO 6 – Para associação, análise feita pelo STF sobre vaquejada é superficial
Prática esportiva tradicional no Nordeste, a vaquejada se tornou ilegal a partir de decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que considerou inconstitucional a lei que regulamenta a atividade no estado do Ceará. A maioria dos ministros entendeu que a vaquejada provoca atos cruéis contra os animais. Mesmo referindo-se à uma lei estadual, a determinação da Corte pode ser aplicada a outros estados e ao Distrito Federal.
“O assunto foi abordado de forma muito superficial e não conseguiu entender o trabalho que tem sido feito pelas associações, que é exatamente o de garantir uma condição de execução das provas de vaquejada preservando a condição de bem-estar tanto dos cavalos como dos bois”, disse o vice-presidente da Associação Brasileira de Vaquejada (ABVAQ), Marcos Studart.
Em seu livro A vaquejada nordestina e sua origem, o escritor Câmara Cascudo diz que a vaquejada é a festa tradicional do ciclo do gado nordestino e uma exibição “de força ágil, provocadora de aplausos e criadora de fama”. A atividade se origina no trabalho de apartação (divisão), entre os fazendeiros, do gado criado solto nos campos do sertão. Euclides da Cunha também fala sobre a vaquejada no livro Os Sertões e são muitas as músicas que exaltam vaqueiros e animais. No forró Saga de um Vaqueiro, da cantora e compositora Rita de Cássia, os versos mostram a tradição: "desde cedo assumi minha paixão/de ser vaqueiro/ de ser um campeão/nas vaquejadas sempre fui batalhador/consegui respeito por ser um vencedor".
Apesar de tradicional, segundo Studart, a prática se modernizou e se autorregula para preservar a saúde de vaqueiros e animais. O protetor de cauda, por exemplo, é um dos cuidados com os bovinos para evitar danos à saúde do animal, informou. Trata-se de um rabo artificial feito com uma malha de nylon que é fixado na base do rabo do boi e que reveste a cauda.
Em seu voto, o ministro Marco Aurélio, argumentou que, conforme laudos técnicos contidos no processo da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), os animais envolvidos nas vaquejadas sofrem fraturas nas patas e no rabo e têm, eventualmente, a cauda arrancada. Segundo o vice-presidente da ABVAQ, essa descrição não faz parte da prática moderna da vaquejada.
“Quem acompanha a vaquejada sabe que isso não é verdade. Existem formas de realizar o evento que permitem perfeitamente o cuidado com esses animais. São bois que são apresentados como espetáculo e precisam estar bem alimentados e bem cuidados. Atualmente, os bois que participam das vaquejadas são alugados. Então, o dono do boi não permite que o animal seja maltratado. Já com relação aos cavalos, que são vendidos por centenas de milhares de reais, não tem sentido imaginar que eles passam por algum tipo de maltrato.”

EXCELENTE MATERIAL SOBRE O TEMA: à A prática da Vaquejada à luz da Constituição Federal







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