terça-feira, 12 de setembro de 2017

Aula 14/2017 - Racismo



TEXTO 1 – FATO MOTIVADOR - Marcha racista em Charlottesville eleva tensão nos EUA
A tensão racial aumentou nos Estados Unidos (EUA) após os episódios do último sábado (12/8). Grupos supremacistas brancos realizaram uma marcha na pequena cidade de Charlottesville, no estado da Virgínia. Com palavras de ordem contra negros, homossexuais, imigrantes e judeus, os manifestantes racistas protestavam contra a retirada da estátua do general Robert E. Lee, de um parque local.
Durante a Guerra de Secessão (1861-1865), o general Lee lutou no Exército Confederado, que defendia a manutenção do sistema de escravidão dos negros. Ele é considerado um herói por grupos da extrema-direita e símbolo do poder branco sulista.
Em oposição à marcha, grupos antirracistas convocaram um contraprotesto. Houve confrontos, e uma mulher que protestava contra os supremacistas morreu atropelada por homem simpatizante do nazismo. Dois policiais também morreram após a queda de um helicóptero que monitorava os protestos e outras 19 pessoas ficaram feridas
O presidente dos EUA, Donald Trump, hesitou inicialmente em condenar explicitamente o protesto supremacista e pior: equiparou as atitudes dos grupos racistas e antirrarcistas. Dois dias depois, pressionado pela opinião pública, discursou em tom crítico contra os supremacistas. A questão é delicada para Trump, que, com sua postura antimigratória e xenófoba, atraiu a simpatia dos supremacistas brancos, que o apoiaram nas eleições presidenciais de 2016.
A herança escravagista
A luta por Direitos Civis

TEXTO 2 - Marcha racista e neonazista nos EUA deve ter animado muita gente no Brasil
Sabe a humanidade? Então, ela deu errado.
Bradaram que ''Vidas brancas importam'', uma referência ao movimento ''Black Lives Matter'', contra a morte de negros pelas mãos do poder público. Sem pudor algum.
Considero um insulto alguém dizer que brancos são vítimas de preconceito estrutural e se compararem a negros ou outros grupos historicamente explorados, tanto aqui como lá. Aliás, quando alguém reclama de ''racismo contra brancos'' na verdade está insatisfeito com a reação desses grupos contra a opressão. Ou se manifestando contra a aplicação das já tímidas políticas públicas, adotadas por pressão da sociedade civil, para reverter um quadro de injustiça social crônica.
A marcha foi lá, mas deve ter animado muita gente por aqui. No Brasil, há um genocídio de jovens pobres e negros nas periferias das grandes cidades, homossexuais são vítimas preferenciais de assassinatos e espancamentos e migrantes sofrem preconceito e são escravizados – sejam em grandes fazendas, na construção civil ou em oficinas de costura.
Há um pessoal que não se indigna diante do fato da mulher negra ganhar, em média, muito menos que o homem branco para uma mesma função. Indigna-se com quem diz que racismo existe. Não fica revoltado diante da morte de jovens pobres e negros. Revolta-se com a filha negra da empregada se sentar no mesmo banco de faculdade que eles. Não acha preconceito dar porrada no sujeito que foi acusado de roubar o próprio carro no estacionamento de um supermercado por ser negro. Para ele, preconceito são cotas. Seria cômico se não fosse trágico o perigo representado por um grupo branco (com direitos assegurados) que se manifesta de forma organizada – e, por vezes, violenta – diante da luta de outros grupos por sua dignidade.
Lembrando que ''maioria'' e ''minoria'' não são uma questão numérica, mas dizem respeito ao nível de efetivação da cidadania, uma maioria reivindica a manutenção de privilégios, garantindo, dessa forma, o espaço que já é seu (conquistado por violência, a ferro e fogo).
Ir contra a programação que tivemos a vida inteira, através da família, de amigos, da escola, da mídia e até de algumas igrejas em que pastores pregam que ''africanos são amaldiçoados por Deus'' é um processo longo pelo qual todos nós temos que passar. Mas necessário. Todos nós, nascidos neste caldo social de sociedades de herança escravista, como os Estados Unido e o Brasil, somos potencialmente idiotas a menos que tenhamos sido devidamente educados para o contrário. Pois os que ofendem uma jornalista de forma tão aberta, como foi o caso da apresentadora Maria Júlia Coutinho, da TV Globo, só fazem isso por estarem à vontade com o anonimato (Hanna Arendt explica) e se sentirem respaldados por parte da sociedade. Toda a vez que alguém trata da questão da desigualdade social e do preconceito que negros e negras sofrem no Brasil (herança cotidianamente reafirmada de um 13 de maio de 1888 que significou mais uma mudança na metodologia de exploração da força de trabalho, pois não permitiu bases para a autonomia real dos trabalhadores africanos e seus descendentes), é linchado em redes sociais.
E isso, por fim, empodera muita gente. Que sai às ruas com tochas. Cultivando ódio. Lembrando a abominável Ku Klux Klan. E, sem que o ato seja devidamente repudiado pelo governo, o monstro cresce. Sem sabermos até onde ele pode ir. Um sentimento de vergonha alheia, muito maior do que sair pelado na rua, com purpurina dourada no corpo, com um cabrito imolado nas mãos, toma conta de mim quando vejo esse povo branco, hétero e homem dizer que se sente oprimido por negros, gays, lésbicas, transexuais, migrantes, judeus. Nessas horas, só posso citar a sabedoria presente na mitologia cristã, uma das melhores passagens de toda a bíblia, em minha humilde opinião.
Evangelho de Lucas, capítulo 23: Pai, perdoai. Eles não sabem o que fazem

TEXTO 3 - Intolerância, racismo às claras e fuzis à mostra: maior protesto movido pelo ódio em décadas nos EUA
O protesto "Unite the Right", ou "Unir a Direita", até então não tinha muito espaço na imprensa. Alguns blogs chamavam atenção para o ato, alguns com elogios à celebração do orgulho e nacionalismo americano, outros com críticas à ideia de segregação que estes valores podem carregar. Meu vagão no trem era heterogêneo. Famílias voltavam para a cidade com bebês para o almoço de domingo com os avós, estudantes vinham reencontrar pais e namorados, um ou outro jornalista fingia que estava ali por coincidência e achava que estava sendo discreto mexendo freneticamente em seu computador, tablet e celular (eu era um deles).
Quatro homens chamavam atenção na fileira ao lado. Carecas, fortes, cheios de tatuagens, vestindo calça bege e camisa branca, eles conversavam sobre algo sério - e me olhavam muito feio quando eu tentava ler seus lábios, que sussurravam e me deixavam pescar apenas palavras soltas. Uma delas foi "hate" - ou ódio.
Pois foi exatamente ódio o que eu encontrei nas horas seguintes. A extrema-direita está em ascensão nos EUA?
Enquanto desfazia a mala, li no Twitter boatos de uma possível demonstração-surpresa dos manifestantes, que haviam feito um acordo com a prefeitura para desfilar pela cidade só no dia seguinte.
Era sexta-feira à noite e eu corri para a Universidade de Virginia, ao norte do centro da cidadezinha de casarões preservados e praças com monumentos antigos. O campus estava escuro, vultos andavam de um lado para o outro em busca de algum sinal.
Um grupo de aproximadamente 20 homens subiu em passo acelerado em direção ao jardim interno. A 50 metros de distância, um grupo menor os seguia. Corri até eles pela penumbra.
Um homem com tom agressivo começa a falar no megafone. "Alinhem-se agora! Duas filas! Todos! Agora!"
A linha iluminada pelas tochas já alcançava o horizonte quando eles começaram a marchar. "Vocês não vão nos substituir!", "Judeus não vão nos substituir!", "Vidas brancas importam!", gritavam, bradando também ofensas a gays e estrangeiros.
"Sou nazista, sim", "A negra está assustada", "Suma daqui, viadinho", "Ele não é americano". Os gritos raivosos, partindo do meio das tochas que homenageavam a Ku Klux Klan (grupo racista que promoveu linchamentos, enforcamentos e assassinatos de negros), bastões de baseball e socos ingleses.
A caminhada terminou com uma briga generalizada com estudantes que tentaram impedi-los de se aproximar da estátua de Thomas Jefferson, terceiro presidente americano, em frente ao prédio principal da universidade.
Durante quatro horas, homens com suásticas tatuadas no crânio e bandeiras confederadas (símbolo do grupo que lutou na guerra civil americana por manter a escravidão) trocavam socos, pauladas e cusparadas com jovens vestindo máscaras e carregando bastões de madeira e sprays de pimenta. Eles se batiam até sangrar, e policiais como o velho Manny assistiam a tudo de longe, visivelmente impotentes diante de grupos numerosos, estimados entre 2 e 6 mil pessoas, segundo a mídia local.
Os nacionalistas, neonazistas, supremacistas brancos e simpatizantes se concentravam na praça, em torno da estátua do general confederado Robert E. Lee, um dos principais defensores da escravidão. Antifascistas, punks, anarquistas e simpatizantes (incluindo hippies de roupas coloridas e tranças como os que vemos nos vídeos de Woodstock) ficavam do lado de fora.
Para entrar na praça, os nacionalistas precisavam atravessar um paredão formado por antifascistas. Durante o caminho saltavam ofensas pesadas de ambos os lados, e volta e meia os ataques verbais se tornavam físicos.

TEXTO 4 - O que foi a Ku Klux Klan? Ela ainda existe?
A Ku Klux Klan (KKK) foi uma organização racista secreta que nasceu no final do século 19 nos Estados Unidos. Ela foi fundada em 1866, no Tennessee, como um clube social que reunia veteranos confederados, ou seja, soldados que haviam lutado pelos estados do Sul, o lado derrotado, na Guerra Civil Americana (1861-1865). As duas palavras iniciais do nome da organização, “Ku Klux”, aparentemente vêm da palavra grega kyklos, que significa “círculo”. Já o termo “Klan” teria sido acrescentado para dar melhor sonoridade à expressão, além de fazer uma referência aos velhos clãs, grupos familiares tradicionais. Muito mais do que um clube, a KKK se transformou numa entidade de resistência à política liberal imposta pelos estados do Norte após a Guerra Civil, que assegurava, entre outras coisas, que a abolição da escravatura fosse mesmo cumprida. Na defesa da manutenção da supremacia branca no país, o grupo promovia atos de violência e intimidação contra os negros libertados.
Seus militantes adotaram capuzes brancos e roupões fantasmagóricos para esconder a identidade e assustar as vítimas. A partir de 1870, o governo americano decidiu enfrentar a organização e, em 1882, a Suprema Corte do país declarou inconstitucional a existência da KKK. “Ela parecia ter desaparecido durante os últimos anos da década de 1880, mas foi revivida em meados do século 20”, diz a historiadora e jornalista americana Patsy Sims, da Universidade de Pittsburgh. A nova KKK foi criada em 1915, no estado da Geórgia, e não era mais movida apenas pelo ódio contra os negros. Sua doutrina misturava agora nacionalismo e xenofobia a um sentimento romântico de nostalgia pelo “velho Sul”. “Durante essa reencarnação, a KKK tinha como alvos de sua violência os imigrantes, além de católicos, judeus e negros”, afirma Patsy. Uma cruz em chamas se tornou o símbolo da nova organização, que chegou a ter 4 milhões de membros.
Após a Grande Depressão dos anos 30, porém, ela perdeu força novamente, apesar de ter voltado à ativa na década de 60, durante os movimentos pelos direitos civis, que defendiam a igualdade racial nos Estados Unidos. No fim dos anos 70, grupos anti-Klan deram o golpe final na organização ao atingir o bolso dos líderes racistas, exigindo nos tribunais grandes indenizações para vítimas de seus atos violentos. “Embora a Ku Klux Klan ainda exista, sua força hoje é pequena. A maioria dos militantes radicais aderiu a grupos ainda mais violentos de defesa da supremacia branca, como a Nação Ariana e outras organizações ligadas ao neonazismo“, afirma Patsy.

TEXTO 5 - 'Não vou falar com preto': executivo negro relata racismo no mundo corporativo brasileiro
Cesar Nascimento pode vestir paletós caros, óculos de grife, sapatos italianos. Frequentar restaurantes sofisticados de São Paulo. Ter funcionários sob suas ordens, ir a reuniões com parceiros internacionais, falar inglês. Cesar Nascimento pode fazer tudo isso, mas diz que não será tratado como igual entre seus pares. Ele não pode mudar a cor de sua pele. É um executivo negro.
Como tal, Nascimento, 63 anos, muitos deles passados em multinacionais como Microsoft e a agência de publicidade J. Walter Thompson, sempre precisou provar a seus clientes que era, sim, o diretor financeiro - e não um assistente. À BBC Brasil, disse que o preconceito também o atingiu quando abriu sua consultoria, nos anos 1990. Mas aí descobriu como o racismo poderia ajudá-lo: aproveitava a estranheza causada em seus clientes para fechar negócio.
"Usei o racismo como mola propulsora. Já tinha passado por experiências de chegar em algumas companhias me identificando como o Cesar Nascimento, sócio da empresa X, e me deixarem na recepção. Eu não batia com o estereótipo do empresário. Deixaram de me atender por causa disso. Porque alguém avisava, as pessoas chegavam (na sala de espera), (me) olhavam...e eu não passava."
"Quem não sofre racismo ou discriminação não entende exatamente. Hoje o movimento feminista conseguiu expandir esse conceito, mas não é a mesma coisa. O que esses grupos sofreram nunca os tirou completamente a possibilidade de desenvolvimento econômico. Conosco, negros, sempre fomos tolhidos em dois aspectos: educação e mercado de trabalho. A gente não tinha credibilidade ou não era aceito enquanto empresário por sermos negros. Passei situações (complicadas) como um profissional de experiência que monta uma empresa, mas perde os sobrenomes importantes da carreira. Antes, era o Cesar da (auditoria) PriceWaterhouseCoopers, o Cesar da Thompson, o Cesar da Microsoft. São sobrenomes importantíssimos. Quando passei a ser o Cesar da minha empresa...vinha a pergunta: 'quem?'. Tudo que aprendi enquanto profissional foi esquecido.
Comecei a crescer por causa de empresas estrangeiras vindo para o Brasil. Elas acabavam me contratando sem saber o que eu era, gostavam do meu serviço e irradiavam isso. Caía a questão racial, mesmo porque para eles não fazia diferença, eu era só mais um brasileiro.
Depois, graças a um ex-colega, tive entrada grande num grupo da área de alimentação, o que me permitiu buscar uma pessoa para ajudar na parte comercial. Aí comecei a usar (o racismo a meu favor). Ele era o típico ítalo-descendente, então tinha as portas abertas. Havia situações de entrarmos (nas empresas) e todas as atenções iniciais ao 'grande executivo que vem nos visitar' irem para ele. E percebia que me colocavam como o assistente ou coisa assim. Deixava a coisa correr. Aí quando eu tomava as rédeas (da negociação) - 'ah! ele que toma a decisão' -, notava o embaraço das pessoas. Essa era a hora de fechar o contrato porque elas estavam fragilizadas e tinham medo de dizer não, para não serem acusadas de racismo. É um mecanismo interessante.
Fiz uma observação (ao longo dos anos): meus amigos ricos de verdade nunca tiveram problema comigo ou com minha família, porque eles não têm mais nada para provar para ninguém. Agora, a classe média ascendente é discriminatória, porque ela não quer ser mal vista por ter um amigo negro ou ir a um restaurante onde tem negro. O rico mesmo não está nem aí, você não é ameaça para ele."

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